O ensino florestal começou na Alemanha em 1811, paralelo a isso seguiram-se outras iniciativas em países na Europa, tal como na história aqui narrada  


E aí floresteiros, já ouviram falar do berço da Silvicultura como ciência que hoje é ensinada em todos os cursos de Engenharia Florestal do Brasil? Se você desconhece esta história, eu terei o prazer de lhes contar! Em 15 de agosto de 1869, foi inaugurada a primeira escola florestal italiana em Vallombrosa, o Instituto Florestal de Vallombrosa, com o objetivo de treinar os primeiros oficiais da administração florestal do jovem Estado italiano, unificado em 1861. A direção do Instituto foi confiada ao Inspetor Geral de Florestas Adolfo de Bérenger (1815-1895), que havia promovido fortemente a instituição durante anos.

Abadia de Vallombrosa, em 1865 (Fonte: Firenze University Press 2013).

A idealização deste instituto começou com ida de inspetores da administração das florestas italianas para a Suíça, Alemanha e França, para se especializarem em ciências florestais. A capital italiana naquele momento estava sediada na magnifica Florença, berço renascentista e o governo havia confiscado a abadia e a floresta de Vallombrosa, até então de propriedade eclesiástica e administrada pelos monges beneditinos Vallombrosan.  Estes monges liderados pelo frade Giovanni Gualberto, no início do século XI, ocuparam esta região montanhosa depois de se abrigarem em uma frondosa árvore, ao fugirem de uma tempestade.

Pouco tempo depois, estes monges fundaram a abadia de Vallombrosa, que concentrava um centro de estudos sobre florestas, ainda que empiricamente. Estes monges reflorestaram toda a região do Vallombrosa, resultando num lugar onde hoje é considerado uma das melhores regiões para ecoturismo na Europa, onde apresenta temperaturas amenas, até mesmo nos fortes verões europeus. Não há informações claras sobre a escolha de Vallombrosa como sede do Instituto Florestal, mas parece lógico, associar à mudança da Capital de Turim para Florença, em 1865. No entanto, de acordo com Adolfo de Bérenger, a tradição florestal de longa data de Vallombrosa influenciou sua escolha, pois os governantes italianos haviam ficado impressionados com a vastidão dos bosques que cercavam Vallombrosa. Assim, estes governantes que há muito tempo ansiavam pela ideia de proporcionar de alguma forma a educação técnica dos numerosos funcionários florestais do Reino, tiveram a feliz inspiração de escolher Vallombrosa como local adequado para todos abrirem um curso trimestral, para formação de estudantes florestais.

 À época, Vallombrosa teve um importante e reconhecido papel religioso, cultural e florestal, graças aos monges beneditinos, que ostentavam nomes muito famosos em ecologia, meteorologia, hidrologia, agronomia, silvicultura e botânica. Desde o estabelecimento da comunidade monástica em 1035, Vallombrosa sempre teve uma vocação tipicamente silvopastoril. A primeira notícia da venda de madeira de Abeto branco (Abies alba) pelos monges remonta a 1389, que, ao longo dos anos, desenvolveram e codificaram o sistema de cultivo de florestas para diferentes espécies de coníferas, além de uma prática de silvicultura que foi então transferida e adotada em outras realidades florestais do país e além. Além disso, não se deve esquecer que o então embaixador americano na Itália, George Marsh, que inspirou os parques americanos, dentre eles o Yellowstone, e autor do conhecido Homem e Natureza, residiu na abadia por um longo tempo até seu falecimento em 1882.

Sede do antigo Instituto Florestal Vallombrosa, em 1869 (Fonte: Firenze University Press 2013).

Dessa forma por meio da atividade destes monges, a abadia de Vallombrosa concentrava os mais antigos manuscritos sobre silvicultura da Europa. Dessa forma, em outubro de 1867, iniciou-se o primeiro curso experimental de educação florestal na Itália, com duração de cerca de 3 meses, dirigido pelo inspetor florestal Giuseppe Viglietta. O primeiro curso oficial do Instituto Florestal Vallombrosa, com duração de três anos, começou em de setembro de 1869, com exames de admissão para estudantes. Em 1888, a duração dos estudos passaria para quatro anos.

Os eventos políticos do país que ocorreram entre o final do século XIX e o início do século XX destacaram a necessidade de criar um grande centro de estudos florestais menos isolado do que o Vallombrosa, mais acessível aos estudantes e em condições climáticas menos desfavoráveis. Assim, em 1912, foi criada uma escola para agentes florestais graduados em Vallombrosa e em 1913 o Instituto Florestal de Vallombrosa foi transferido para Florença na antiga vila do Grão-Duque de Cascine, com o nome de Instituto Superior de Silvicultura Nacional, sob direção de Arrigo Serpieri, membro do Conselho Superior de Florestas.

Sede do antigo Instituto Superior de Silvicultura Nacional, em 1914 (Fonte: Firenze University Press 2013).

Após a criação da Universidade de Florença em 1924, o Instituto Superior de Silvicultura Nacional foi incorporado pela nova Universidade e transformado em um Instituto Agrícola e Florestal, e em seguida, tornou-se a Faculdade de Agricultura e Florestas, em 1936. Dentro do corpo docente, desde a sua criação, os cursos de graduação em Ciências Agrárias e Ciências Florestais foram ativados. Este último campo de estudo é hoje representado pelo curso de três anos em Ciências Florestais e Ambientais e pelo Mestrado em Ciências Florestais e Tecnologias da Escola Agrícola.

A relação entre os cursos de graduação de Ciências Florestais, em Florença e a atual Reserva Biogenética do Estado de Vallombrosa, ainda é firme e ativa. É na histórica floresta de Vallombrosa, hoje administrada pelo Departamento de Biodiversidade do governo italiano, que a cada ano os “floresteiros” realizam atividades práticas de colheita, silvicultura e dendrometria, sendo estas atividades consideradas indispensáveis para a correta formação dos graduandos em Ciências Florestais.

Aos floresteiros que, se algum dia forem temporada na Europa, vale muito a pena conhecer a floresta de Vallombrosa, é um lugar encantador, proporcionando uma conexão mítica entre homem e natureza. Sem contar a possibilidade de ver com os próprios olhos muitas das árvores plantadas por Giovanni Gualberto, canonizado como santo pelo Papa Pio XIII, considerado patrono dos Engenheiros Florestais. Uma curiosidade adicional é que devido ao São João Gualberto Florestal, em português, que o dia 12 de julho é dedicado aos engenheiros florestais, pois esse seria o dia em que o monge nasceu.

Primeira turma de Ciências Florestais da Universidade de Florença, em 1924 (Fonte: Firenze University Press 2013).

Turma do centenário do curso de Ciências Florestais da Universidade de Florença, em 2014 (Fonte: Rodrigo de Sousa Oliveira, 2014).


Sede atual do curso de Ciências Florestais da Universidade de Florença, em 2014 (Fonte: Rodrigo de Sousa Oliveira, 2014).

Por Rodrigo de Sousa Oliveira
Engenheiro Florestal (Universidade Federal de Goiás/Universitá degli Studi di Firenze)
Mestre e Doutorando em Melhoramento Genético de Plantas (Universidade Federal de Goiás)

Comentários

Postagem Anterior Próxima Postagem