Modelo Digital de exploração Florestal (Modeflora) utiliza drones e inteligência artificial
Imagem: Evandro Orfanó |
O Modelo Digital de Exploração Florestal (Modeflora), tecnologia lançada pela Embrapa Acre, completa 15 anos, com adoção em 100% dos planos de manejo do estado do Acre. A ferramenta confere maior eficiência ao planejamento e execução das operações de campo, proporciona economia no processo de produção e permite o monitoramento das etapas de manejo, além de facilitar o trabalho de fiscalização e controle dos órgãos ambientais. Esses resultados ajudaram a tornar a atividade florestal mais produtiva e sustentável.
A automação da atividade de
manejo florestal é uma tendência na Amazônia. De acordo com estudos de impacto realizados pela Embrapa,
com a participação de empresas do setor florestal e instituições ligadas ao
meio ambiente, o Modeflora é adotado em seis estados da Amazônia (Acre, Amapá,
Roraima, Rondônia, Amazonas e Pará). Desde 2008, já foram manejados 415
mil hectares de floresta com uso da tecnologia na região. Análises confirmam
redução de 31,5% nos custos da atividade florestal, em relação ao manejo
convencional. Somente em 2021, a aplicação da ferramenta digital no manejo
de 40 mil hectares de florestas rendeu uma economia de, aproximadamente,
R$ 11 milhões ao setor florestal amazônico.
O pesquisador da Embrapa Marcus
Vinício Neves d'Oliveira explica que o Modeflora representa um salto
qualitativo no manejo de florestas tropicais, por possibilitar informações
precisas sobre a topografia do terreno e a localização exata das árvores na
área a ser manejada, entre outros aspectos essenciais para planejar a atividade
com segurança. A tecnologia ajudou a garantir maior eficiência e
competitividade ao manejo florestal madeireiro e tornou o negócio mais
rentável, com menor impacto ambiental.
Foto: Mauricília Silva |
“Antes do modelo digital, o
planejamento da atividade de manejo envolvia desenhar a área de forma manual e
realizar longas caminhadas na floresta, para marcação e localização física das
árvores. A ausência de informações precisas ocasionava equívocos, como a
abertura de pátios de estocagem em área de baixa densidade de árvores e de
estradas em áreas de proteção ambiental. As ferramentas digitais possibilitam
agilidade no inventário florestal e a definição de locais adequados para os
pátios de estocagem e estradas na floresta, de acordo com as condições do
ambiente modelado, padrão de distribuição das espécies, concentração de árvores
de valor comercial e outros aspectos que influenciam a dinâmica de execução do
manejo florestal e conferem sustentabilidade à atividade”, conta o
pesquisador.
As geotecnologias nas florestas do Acre
O uso de geotecnologias no manejo de florestas acreanas tem como marco uma resolução conjunta dos então Conselho Estadual de Meio Ambiente, Ciência e Tecnologia (Cemact) e Conselho Estadual de Florestas do Acre, publicada em 2008. De acordo com o engenheiro florestal Renato Mesquita, analista do Instituto do Meio Ambiente do Acre (Imac), órgão responsável por autorizar e acompanhar a atividade florestal, a normativa incentivou o processo de digitalização dos planos de manejo florestal no estado e contribuiu para ampliar o uso do Modeflora por empresas florestais.
Foto: Evandro Orfanó |
“Embora não seja uma exigência
para aprovação dos planos de manejo florestal, em função dos ganhos
proporcionados, o próprio mercado buscou se adaptar para adoção da tecnologia
digital, já que o manejo de florestas nos moldes tradicionais é demorado e
oneroso. Por facilitar tanto a elaboração como a execução e acompanhamento do
planejamento, o Modeflora melhorou a eficiência da atividade florestal. Hoje,
todos os planos de manejo do estado são executados com ferramentas do
Modeflora. Além disso, a tecnologia também contribui para a identificação de
ilícitos, como o desmatamento ilegal em áreas manejadas", ressalta o
analista.
Dados do Imac mostram que, na
última década, foram licenciados 279 planos de manejo no Acre. O engenheiro
florestal Igor Agapejev de Andrade, sócio-proprietário da Tecman, empresa de
consultoria em projetos florestais e ambientais, um dos empreendimentos
licenciados no estado, destaca que as geotecnologias proporcionam maior agilidade
ao trabalho de levantamento e rastreamento da produção e tornam mais
transparente a execução dos planos de manejo.
“Participei do primeiro curso
sobre o Modeflora e percebi que a tecnologia iniciava uma nova era no manejo
florestal. Antes, para executar a atividade era preciso ir a campo com grandes
equipes. Com o Modeflora reduzimos o número de pessoas envolvidas nesse
trabalho e as despesas com mão de obra, especialmente na etapa de abertura de
picadas e estradas, um dos aspectos que mais oneram a atividade florestal.
Essas vantagens baixaram os custos do processo produtivo e despertaram o
interesse de empresas do setor”, destaca Andrade.
Imagem feita com drone mostra área foliar - Foto: Evandro Orfanó |
Para adoção da tecnologia foi necessário implementar uma extensa agenda de capacitação, envolvendo conhecimentos sobre geoprocessamento, cartografia, sistema de informação geográfica, modelagem de dados espaciais e georreferenciados e elaboração de mapas. "Já treinamos mais de mil profissionais do setor florestal e órgãos fiscalizadores do Acre e outros estados, além de estudantes de graduação e pós-graduação que hoje atuam no manejo de florestas, em diferentes localidades da Amazônia. Em função do cenário de inovação tecnológica, que requer novos conhecimentos e habilidades com as geotecnologias, a demanda por capacitações tem sido contínua”, diz o analista da Embrapa Daniel Papa.
Drones e inteligência artificial para manejar a floresta
Lançado em 2007, o Modeflora
reuniu inovações tecnológicas como o uso do Sistema de Posicionamento Global
(GPS), Sistema de Informação Geográfica (SIG) e Sensoriamento Remoto (SR), para
fornecer informações de alta precisão sobre a floresta. Com o tempo, o
modelo se renovou e agregou geotecnologias como o Lidar (Light Detection and
Ranging) – sistema de perfilamento a laser que fornece imagens da floresta
em 3D – e os drones, ferramentas que utilizam princípios de inteligência
artificial (algoritmos), redes neurais e aprendizagem profunda. Essas
tecnologias se alinham ao “Manejo Florestal 4.0”, conceito de produção
florestal baseado na automação, geração, transmissão e tratamento de dados de
alta precisão.
Foto: Mauricília Silva |
Para d’Oliveira, esse “upgrade”
tecnológico tem contribuído para aprimorar continuamente o Modeflora e
aumentar a sua eficiência. A associação de novas geotecnologias
ampliou a capacidade do sistema de gerar informações que facilitam a tomada de
decisões mais assertivas no manejo florestal. “A partir de imagens de alta
resolução, conseguimos ampliar o conhecimento sobre aspectos do relevo e
hidrografia das áreas manejadas e desenvolver modelos que permitem verificar a
dinâmica de crescimento da floresta e estimar com mais precisão o volume de
madeira e os estoques de biomassa e carbono existentes nesses locais”,
enfatiza.
Na avaliação do pesquisador Evandro
Orfanó, um dos principais desafios do inventário em florestas tropicais nativas
ainda é a localização de árvores de importância econômica, devido a
dificuldades como a transposição de cursos hídricos e visualização dessas
espécies em função da densa vegetação.
“No manejo tradicional era
preciso percorrer grandes distâncias a pé, para identificar cada árvore na
floresta e verificar o potencial de produção da área. Com os drones, mapeamos previamente
a copa das árvores e coletamos informações que facilitam essa localização e uma
avaliação precisa da área a ser explorada, questão essencial para uma produção
sustentável”.
O pesquisador também lembra que,
com as técnicas tradicionais de manejo, uma equipe de planejamento mapeia
apenas 20 hectares de floresta por dia, enquanto hoje, com uso de um drone, é
possível mapear aproximadamente mil hectares diariamente, um ganho fantástico
em desempenho na atividade. “A combinação de diferentes ferramentas
tecnológicas proporciona, ainda, outros ganhos na atividade florestal,
incluindo a cubagem (medição) de madeira em pátios de estocagem, atividade que
otimizou o monitoramento pós-exploratório, essencial para avaliar, de forma efetiva,
o impacto ambiental da atividade florestal”, reforça Orfanó.
Informações
integradas
Outro ganho proporcionado pelas tecnologias digitais foi a integração dos planos de manejo com o Sistema Nacional de Controle da Origem dos Produtos Florestais (Sinaflor), plataforma on-line do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) utilizada por órgãos ambientais do Acre e outros estados para aprovar projetos de manejo florestal. Mesquita explica que contar com informações automatizadas e georreferenciadas no sistema agilizou as avaliações e o licenciamento, tanto do plano de manejo como do plano operacional anual de exploração. Antes, o processo era físico e toda comunicação com o requerente, e com o responsável técnico, se dava de forma presencial, fator que tornava moroso o processo de licenciamento.
“Essa integração também
possibilita informações sobre a execução dos planos de manejo, que ajudam a
identificar se as atividades estão ocorrendo conforme o planejamento, antes das
vistorias presenciais, aspecto que representa um avanço no monitoramento da
atividade florestal. Além disso, como essa base de dados georreferenciados é
permanente, temos parâmetros para retornar a uma área manejada, 10 ou 15 anos
depois, e avaliar os impactos da atividade de manejo na dinâmica da floresta.
Sem os recursos tecnológicos do Modeflora, isso não seria possível”, completa.
Monitoramento de florestas
públicas
Além de conferir maior
sustentabilidade à atividade florestal e ganhos para os empreendimentos de
manejo em áreas privadas, o Modeflora também contribuiu para aprimorar o
trabalho de monitoramento da execução de planos de manejo em florestas públicas
na Amazônia. Desde 2015, a adoção de inovações tecnológicas no manejo florestal
é um indicador técnico de qualificação e desempenho nos editais de concessões
do Serviço Florestal Brasileiro (SFB). O uso do modelo digital por empresas
contratadas no âmbito da Política de Concessões de Florestas Públicas
ultrapassa um milhão de hectares.
"Nas primeiras licitações,
em 2010, observamos que várias empresas já adotavam algumas diretrizes do
Modeflora, com ganhos na atividade florestal. Devido às vantagens competitivas
e práticas, embora não seja uma exigência dos editais, o Modeflora é adotado em
todas as propostas técnicas apresentadas, seja na execução integral das
atividades ou de forma parcial”, relata José Humberto Chaves, coordenador-geral
de Monitoramento e Auditoria Florestal do SFB.
Chaves pontua, ainda, que os
contratos de concessão florestal exigem a adoção de boas práticas na execução
do plano de manejo, para reduzir danos à floresta, o que requer o uso de
técnicas sustentáveis. Com o planejamento de infraestrutura e arraste da
madeira e o inventário florestal georreferenciados, todas as operações ficam
muito bem definidas e espacializadas dentro da Unidade de Produção Anual (UPA).
Isso minimiza o impacto da extração e facilita o trabalho de acompanhamento das
atividades pactuadas nos planos de manejo das concessionárias.
Desafios para o manejo
florestal
Foto: Marcus d'Oliveira |
Segundo Chaves, o atual cenário tecnológico favorece uma atividade florestal mais sustentável. Entretanto, há um descompasso entre a atual legislação florestal e o avanço das geotecnologias. É preciso criar mecanismos para tornar a adoção dessas ferramentas um requisito legal para aprovação e execução de planos de manejo. “Apesar da eficiência comprovada do Modeflora, ainda é possível aprovar e executar propostas de planos de manejo florestal baseadas no uso de técnicas analógicas. Isso mostra a necessidade de revisar aspectos legais que permitam incluir diretrizes e normatizar o uso de informações georreferenciadas no manejo de florestas”, afirma.
Do ponto de vista da pesquisa, as
geotecnologias são fundamentais para a construção de uma base de dados ampla e
segura sobre a floresta amazônica, que possibilite consolidar novas estratégias
para conservação dos recursos florestais existentes e de suas funções vitais
para o planeta. "Essas tecnologias têm permitido análises cada vez mais refinadas
da floresta, o que mostra que o manejo florestal é uma atividade dinâmica, com
desafios que exigem um olhar da pesquisa para o amanhã. Então, atuamos sempre
para renovar nosso pacote tecnológico e aprimorar os resultados
alcançados", avalia D’Oliveira.
Um dos resultados desse esforço
contínuo da pesquisa, com foco no manejo do futuro, é o projeto Geotecnologias
aplicadas à automação florestal e espacialização dos estoques de carbono em uso
nativo e modificado da terra na Amazônia Ocidental (Geoflora), executado com
recursos do Fundo JBS pela Amazônia, desde julho de 2022, como uma nova etapa
do Manejo 4.0. Segundo Orfanó, com o Modeflora foi possível reproduzir o
desenho da floresta, com base em imagens de alta resolução, obtidas com ajuda
de aeronaves e sensor a laser. Na fase atual, com o amadurecimento da
tecnologia, a pesquisa dá um passo adiante.
“Avançamos para o treinamento de
algoritmos de inteligência artificial, espécie de modelo matemático que pode
ser aplicado para diversas finalidades. O objetivo é tornar essas ferramentas
especialistas na realização de inventários florestais totalmente automatizados,
em áreas de floresta com espécies como açaí, murumuru, copaíba, castanheira,
cumaru-ferro, garapeira, copaíba e cedro. Em um futuro próximo, os algoritmos
funcionarão como “mateiros eletrônicos”, capazes de identificar e localizar
espécies florestais, por sensoriamento remoto, e estimar tanto o volume de
madeira como os recursos florestais não madeireiros, reduzindo
significativamente o trabalho de campo”, diz o pesquisador.
O manejo florestal de precisão
integra o rol de contribuições tecnológicas da Embrapa para o futuro da
Amazônia, bioma que abriga cerca de 40% das florestas tropicais existentes,
recursos naturais vitais para a regulação do clima global e para a distribuição
de chuvas na região.
A expectativa dos pesquisadores é
que empresas do setor florestal, comunidades extrativistas e órgãos de
fiscalização possam transformar o conhecimento gerado pela pesquisa em
oportunidades para a conservação do meio ambiente e melhoria da renda e do
processo de controle ambiental na região.
Todas as informações sobre o Modeflora estão descritas na publicação Manejo de Precisão em Florestas Tropicais: Modelo Digital de Exploração Florestal.
Fonte: Diva Gonçalves - Embrapa Acre
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